HAIMBAUNT












Imagem coletada no banco de Imagens do Google. 


A Procura

Ao longo de seu breve existir ele caminhou por entre os homens, em grande solidão e quietude, veiculando-se com modéstia e introspecção. Agia com naturalidade, herdeiro das tradições dos homens e filho da humanidade, em tudo era humano, contudo, algo o chamava a ser diferente, algo o chamava a ir além e esse chamado acabava por dar-lhe um matiz diferente da dos demais homens, dos quais era coevo. Ele procurava e havia aquela voz que o chamava. Era uma voz cotidianamente assonora e quando dormia, essa voz lá estava, sempre sem som, apenas uma voz intuída que, lhe dizia muitas coisas. As coisas que esta voz lhe dizia, eram quase sempre inefáveis, incognoscíveis, produziam nele um sentido, sustentavam nele a sua busca, mas estavam além de sua capacidade de cognição, sendo indecifráveis ao intelecto, muito embora, misteriosamente se amalgamassem em sua débil razão, produzindo lhe sentidos e mantendo-o em continua busca. Assim ele viveu a procura, desde a infância, até a metade de sua quarta década de existência terrena.

O Encontro

O mundo vivenciava, mais uma pandemia e recluso em seu pequeno pedaço de chão em contato com a natureza e com a terra, cultivando o solo e se encontrando com a mística da natureza, ele sentiu que encontrava uma resposta. Não era uma resposta integral e tão pouco, uma resposta definitiva, mas era uma resposta a algumas das inúmeras perguntas que ele já havia feito, ao longo de seu caminho. A resposta lhe vinha como uma imagem indescritível, como um enigma claro que se traduzia a ele sem palavras e numa linguagem que a pobre linguagem dos homens não dava conta de abarcar e traduzir. Essa resposta imagética que, endereçada a ele, não podia ser a outro transmitida, sendo irrepetível, intraduzível, cognoscível tão somente ao seu eu profundo, que de tão profundo, mesmo ele o ignorava e desconhecia, muito embora, o sentisse sem saber o que era. Essa resposta estava mais próxima da plenipotência do que da eloquência. Ela não visava atribuir um sentido unilateral e definitivo, mas como o arquétipo junguiano, era um figura plenipotente que, a cada vez que era revisitada, comunicava uma nova verdade, um novo sentido, uma nova resposta.

Atônito e profundamente impactado, sem poder falar sobre o que recebia, em vão ele buscou no intelecto, nos livros e nas ciências uma maneira de trazer ao lugar comum da linguagem humana, aquela imagem plenipotente e suas respostas. Não conseguindo reduzir o irreduzível, decodificar o incognoscível ele decidiu simplesmente aceitar a resposta e deixá-la amalgamar-se em seu ser e produzir o que ela precisava produzir. Nesse labor ele permaneceu por um ciclo anual inteiro. A praga que assolava o mundo derrubava as mascaras dos homens e os desnudavam em público, revelando suas chagas e suas deformidades físicas, morais, éticas emocionais e espirituais. Ensandecidos e despudorados eram muito dos seres daquele tempo. A sandice dos homens revelava a si e ao outro a tragédia humana, que conduziu o mundo humano ao mais profundo abismo, ao mais terrível inferno. Miríades de mortos não foram suficientes para despertas os homens de sua loucura. Um profundo abismo tragava a sociedade humana, arrastando os homens para enfrentarem a si mesmos, defrontando-se com o horror que fizeram de si mesmos. Ele porém, de algum modo foi desperto para um caminho equidistante desse fado humano, embora dele participando. No entanto participando de um outro percurso, que lhe abria uma outra perspectiva com novas possibilidades. Teria sido a sua companheira de viagem, a voz assonora que lhe preparara esse caminho? Longe de poder obter uma resposta ele se questionava, tomando consciência de que ele não era o único no mundo a vivenciar tal realidade. Muitos outros seguindo sua própria experiencia, também escapavam a esse horror no qual o homem civilizado sucumbira.

Indícios e Sinais

Ao longo de suas quatro décadas e meia de jornada material, ele perambulou por muitos caminhos, encontrou muitos ensinamentos, bebeu de muitas fontes. Estas fontes saciavam-lhe a sede por algum tempo, porém, não o saciava em definitivo. Assim, ele ouviu falar de um mestre galileu que teria deixado grande sabedoria como herança aos homens, há mais de dois milênios. Ele buscou aurir os ensinamentos deste mestre e se identificou profundamente com seus postulados, no entanto, os homens que se apropriaram dos ensinamentos do mestre galileu, os desfiguraram de tal maneira que, os tornaram quase irreconhecíveis, e aqueles que tinham como finalidade libertar o homem, foram convertidos pelo próprio homem, em instrumento de encarceramento e escravidão. As sábias e vivificantes palavras que compunham a mensagem do mestre galileu foram dispersas em miríades de outras palavras, separadas umas das outras, editadas e reeditadas, sinonimizadas e camufladas até se tornarem quase inválidas, dissolvidas na multidão imensurável das palavras dos próprios homens, a comporem compêndios e mais compêndios que serviam apenas para lustrarem o raso e opaco intelecto humano. As palavras do mestre galileu eram plenipotentes dede sempre e assim, continuam a ser, o que mudou foi que, juntá-las e recriar o caminho que elas estabelecem com seu poder, tornou-se uma missão quase impossível, um desafio somente possível aos mais determinados e contando com a ajuda de forças extrafísicas, forças que transcendem o domínio do mundo físico a lhes orientar a busca e a recomposição do discurso libertador do divino mestre da Galileia. Perlustrando essa via sacra individual, ele seguiu seu caminho, as vezes por si só, as vezes levado, conduzido por forças que ele não sabiam definir quais eram. Por entre indícios e sinais que lhes eram mostrados, ele ia aglutinando as palavras do mestre galileu ao passo que as encontravam ao longo do seu caminho. Ele não era conhecedor de tais palavras por antecedência para as diferenciar das demais, mas essas palavras santas palavras imortalizantes, elas sabem por si, quem as buscam e assim, conectam-se a estes, por meio de uma sintonia profunda que o mundo desconhece, é a sintonia do amor e da alma e foi assim que paulatinamente elas se lhes foram revelando.

Um Encontro

 Ao longo de sua jornada muitos encontros e desencontros se deram, marcando-o, transformando-o, conduzindo-o até um encontro diferente. Ele que bebera de tantas fontes, que ouvira a tantas vozes, que andara por tantos lugares, encontrou um caminho por entre os escombros de si e do mundo. Era uma pequena e frágil trilha, que ele seguia por longínquos rincões e por tempos imensuráveis. Assim quer na vigília ou quer no sono ele sempre seguia essa trilha, pois ela lhe trazia algum sentido maior do que os que ele já havia encontrado antes em trilhas outras, era esse caminho para ele, o caminho da transcendência. Transcender é ir além do domínio do físico-material, mas por todos os lugares por onde passava, tudo era profunda e irremediavelmente material, mesmo quando vestia aparência de transcendentalidade. Assim, após longa jornada no denso mundo material, tropeçando em suas ilusões e armadilhas, que são engodos para aprisionarem os incautos, ele então ouviu mais uma vez, aquela voz assonora a lhe sugerir algo que ele já havia considerado, mas considerado como uma ilusão, um devaneio bobo e descabido. Dizia-lhe a voz: — Porque buscas fora, o que fora não pode ser encontrado? Essa fala é apenas uma questão e retrata o que ele apreendeu de tudo quanto lhe disse a voz. Com esse questionamento ele foi constatando que, quanto mais seguia a trilha do transcendente, fora no mundo material e de suas coisas, mais ele se tornava árido, mesquinho e igual a todos os homens condenados neste vale de lágrima que a humanidade forjou para si, com suas próprias mãos e com seus próprios esforços. Então ocorreu-lhe como um insight, uma intuição, que ele deveria parar de andar na contra mão.

Ele refletiu demoradamente sobre essa sacada intuitiva e conclui que, buscando fora ele ia cada vez mais longe, sem jamais poder encontrar o que buscava, pois qualquer chance de encontrar o que buscava, seja lá o que fosse que buscava, deveria doravante buscar na direção contrária, pois o objeto dessa busca encontrar-se-ia oculto no sentido contrário ao que percorrera até aquele momento. Uma certeza inquebrantável lhe tomou por inteiro e ele reposicionou-se no caminho e começou a fazer o caminho inverso.

Ao invés de projetar-se no mundo à procura, ele retirava-se do mundo à procura e depois de muito caminhar nessa direção encontrou-se surpreso diante de si mesmo. Todo o caminho que havia percorrido por longos anos, principiara em si mesmo, assim, ele compreendeu que seguir adiante na contramão do mundo material, seria adentrar em si mesmo, e desbravar as profundezas de si. Ele hesitou, temeu, ficou confuso, duvidou... E assim, perambulou pela periferia de seu ser até que movido por algum impulso desconhecido, um vento novo que soprara intrepidamente, ele tomou coragem e sem muita convicção adentrou em si pela primeira vez com a sua consciência a buscar sentidos e compreensão do que era ele por dentro.

Nunca mais ele deixou esse caminho, dentro em si ele foi encontrando coisas novas, que ali sempre estiveram e por isso já não eram tão novas como ele julgava, e essas descobertas de si mesmo o iam transformando e saciando-o como nada no mundo material havia sido capaz de saciar. Nesse percurso porém, havia um agravante, dentro em si ele encontrava-se com muitas coisas das quais fugira e enfrentar tais coisas lhe trazia grande dor, que somando-se as dores do mundo material, do qual ele evadira-se em certo sentido, quando adentrou em si, mas do qual não poderia sair em definitivo, enquanto vestisse um corpo material, assim da soma dessas duas dimensões surgiam lhe os monstros mais vorazes e medonhos e as alucinações mais duradouras e convincentes que ele jamais poderia ter imaginado. Ele sabia de alguma maneira que, não conseguiria fazer essa travessia sozinho e assim, buscou nas palavras do mestre da Galileia, as poucas que havia conseguido reunir, a força necessária para prosseguir.

Ao passo que avançava em si mesmo transformava-se seu aspecto material, sua vida, seu mundo, suas relações, seus desejos, suas prioridades e ele ia encontrando no mundo, outros que faziam também sua jornada interior e estabelecia com estes sempre que possível fosse, um intercâmbio. Das muitas trocas e dos muitos encontros ia se clarificando sua jornada interior, e muito embora encontrasse pessoas incríveis nesse percurso, ele compreendia que era ele um universo singular e que dentro em si a jornada era solitária e não haveria outra maneira de a fazer, senão sozinho.

Ele percorreu os calabouços do seu interior, achou-se e perdeu-se pelos labirintos de seu mundo interior e compreendeu assim, que ele não poderia achar a si mesmo sem ajuda de outro. Essa ajuda já vinha em certa medida de pessoas que dividiam com ele a jornada no mundo material, mas ele sentia e de algum modo intuitivo sabia que, ele precisava de ajuda transcendental. E foi assim, nessa busca de ajuda transcendental que ele entendeu o sentido do orar e vigiar ensinado pelo mestre da Galileia e passou a se utilizar desse recurso. A constante conexão e súplica que é o orar e vigiar, acabou por fim, após longos anos de perseverança nessa lide, por estabelecer alguma conexão com alguma força transcendente e novas luzes lhe chegavam do mundo imaterial. Eram mensagens e ensinamentos que lhe vinham de dentro, em forma de intuições, angústias, percepções, sonhos, etc. E traduzindo os dentro do possível para a linguagem humana, encontrava ele alento para continuar.

Nas leituras ele descobriu a meditação, ensinamento que já está no mundo material a mais de sete milênios, mas que desvirtuado de sua originalidade e integralidade tal qual as palavras do mestre da Galileia, tornara-se inócuo e servo dos caprichos dos homens e suas doutrinas escravizantes. A meditação, no entanto, é uma outra forma com a qual fora ensinado o mesmo caminho que ensinara o mestre da Galileia com o orar e vigiar. O que esses dois caminhos ensinam, é o mergulhar silencioso em si. Mergulho atento e desvelado, em busca de uma dimensão de si, que dorme nas profundezas do ser. Assim, após, longuíssimo percurso de leituras e buscas, questionamentos e auto-observação, ele conseguiu uma síntese que reunia grande poder, pois unia muitas das palavras do mestre da Galileia e de outros mestres de outros tempos, que cumprindo o mesmo caminho que ele intentava para si, venceram os grilhões do mundo material e transcenderam descerrando o véu que vela o individuo humano na dimensão material, o exilando do mundo imaterial transcendente.

Descobrindo a trilha do homem cósmico, foi ele se distanciado do homem místico, pois para ser um homem místico já havia ele sido obrigado a despir-se do homem profano. O homem profano é o homem que está satisfeito consigo mesmo e com o mundo material e seus caminhos ilusórios. Este está na base da jornada humana e mais próximo da animalidade do que qualquer um dos outros. O homem místico, está a meio caminho, sente a transcendência, mas nega o mundo material e dele foge, negando sua condição de ser material e portanto, não estando tão próximo da animalidade, também não está tão próximo da transcendência como imagina. O homem cósmico rompeu o véu que o exilava da transcendência e em plena jornada transcendental redime o mundo material que está todo presente em sua individualidade como um microcosmo, e encontra assim o equilíbrio entre o material e o transcendental estando nas duas realidades simultaneamente, sabendo que uma, a material é transitória, e a outra, a transcendente é perene. Esse homem cósmico está mais perto do divino do que do animal.

 O Grande Encontro

 Certo dia, ele concluiu uma leitura que muito o animou e vivificou, ele lera os ensinamentos de Brahma, e das páginas do grande gita, ele tirou ensinamentos que se amainaram aos ensinamentos do grande mestre da Galileia. Compreendeu ele que embora separados por cinco milênios, tanto o gita, quanto a boa nova do mestre da Galileia eram o caminho, a mensagem que liberta o homem do seu cárcere e lhe descerra as portas do transcendente. Entendeu ele que as palavras tem o poder de guia-lo nesse escuro e apavorante mundo interior, mas que não há receita, todas as receitas são falsas, são ilusões e para nada servem. Todos os ritos, todas religiões são cadeias, que os homens forjam para escaparem a inexorável necessidade de avançarem rumo ao transcendente e se integralizarem na plenitude do divino. Aprendeu ele que, o caminho é individual e intrasferível, mesmo o grande mestre da Galileia que é em si o caminho, a verdade e a vida, o modelo pleno de comunhão com o divino, mesmo ele, fez sua jornada sozinho, solitário, não obstante todo o seu poder, todas as poderosas palavras que suas lições legaram ao homem. A grande maioria, não consegue seguir adiante no seu caminho e ele não pode violar a individualidade de cada um obrigando-os a segui-lo, assim, ele como ser plenamente transcendente, após cumprir sozinho sua jornada, apenas espera que suas palavras possam ser encontradas por cada homem e despertar e nele o desejo de transcender. Quando o individuo encontra as palavras de poder do mestre da Galileia e decide seguir transcendendo rumo ao divino então pelo meditar, pelo orar e vigiar ele emana seu pedido de ajuda e o divino inscrito nele conecta-se ao divino fora dele e o mestre da Galileia, pode então guiá-lo em sua jornada para a eternidade do divino. Foi esse despertar que ele encontrou dentro em si, e vencendo os dogmas esterilizantes dos ritos e credos materialistas do mundo externo, ele passou a procurar as palavras de poder e reuni-las para conseguir avançar em si e assim estabelecer contanto com o seu eu divino adormecido nas profundidades do seu ser. Demorou-se ele por tempo imensurável nesse trabalhoso caminho, até que um dia, ele sem consciência do que se dava, aproximou-se de uma pequena fagulha de luz intensa e inexorável, era o seu eu divino oculto e adormecido em seu próprio ser.

 O Caminho

Esse caminho é apenas um testemunho. Ele não é e não pode ser de modo algum, uma receita, uma prescrição para outros, pois é irremediavelmente o caminho dele. Ao testemunhar, não se propõe ele ser seguido, imitado, discriminado nem para a direita nem para a esquerda, ele testemunha, apenas para que outros também queiram experimentar o transcendente e buscar o próprio caminho dentro em si. Esse é o caminho dele, apenas uma mostra de que ele tem caminhado em si e feito algumas descobertas de si, avançando em direção ao transcendente.

Naquela noite ele despertou, despertou chamado por aquela voz assonora para meditar na solidão da noite, para se colocar em estado de orar e vigiar silenciosamente olhando para si a procura de si. O que ele buscava nesse caminho de milhares de voltas e calabouços no seu interior, o levava a se defrontar consigo mesmo, em miríades de versões de si. Ele encontrava-se com seus monstros a cada novo avanço nesse caminho interior e só podia avançar mais ao passo que enfrentava seus demônios (monstros) interiores e os aceitava assimilando-os conscientemente com gratidão e reverência por serem o que são e fazerem parte do que ele é.

Ele naquela noite acordou, o silêncio sideral cantava em tom elevando a seus ouvidos, como um chiado harmonioso e estridente. Ao passo que se concentrava, o silêncios sideral sedia lugar as vozes do seu interior e acredite o vozerio crescia de tal modo que tornava-se uma algazarra insuportável, somente com muita luta conseguia ele alguns instantes de silêncio, mas nada perene, eram efêmeros instantes, no entanto, eram esses instantes suficientes para avançar na concepção de si, no desnudar do seu eu transcendente, no despertar do seu eu divino. A luta se arrastou por horas extenuantes e que geravam dor física ao seu veículo material. Após longo tempo de luta, aquela já familiar voz assonora lhe deu a seguinte orientação.  — Se queres avançar, desperte o terceiro olho, abra a terceira visão. Ela fica entre os dois olhos, na altura das sobrancelhas. Foque aí sua atenção e siga em silêncio. O que significava: siga em luta, pois silenciar a algazarra interior é uma luta extenuante. Obstinado ele obedeceu e passou a procurar o terceiro olho, na geografia do corpo tal qual lhe indicara aquela voz. Ele se demorou nesse afã e dores oculares lhe adivinham de todos os ângulos dos olhos, dificultando a continuidade do trabalho, seus olhos materiais pareciam lutar para impedi-lo de despertar o terceiro olho e acionar a terceira visão. Ora, todo ser humano com alguma noção de si, mesmo materialmente, sabe que ele possui, um olho direito e um olho esquerdo o que lhe dá então uma visão direita, e uma visão esquerda. O terceiro olho, no entanto, não é de fato em sentido literal um olho a mais que desabrocharia na face do indivíduo, não, o terceiro olho é um ponto localizado entre os dois glóbulos oculares, e, é um ponto extremamente sutil, etéreo, por isso jaz escondido no ser e por isso oculto e tão difícil de ser encontrado. Esse terceiro olho, é mais transcendente do que material, e localiza-se a altura das sobrancelhas entre os dois olhos materiais. Não sendo um terceiro olho material e sendo um caminho etéreo de transcendência, é esse terceiro olho um caminho de acesso ao eu profundo, ao eu divino, escondido nas profundezas do ser.

Uma vez vencida a resistência do corpo que protege o terceiro olho com desconcentração e dores, para impedir assim, o seu acesso, o ser avança em si, por um caminho que está paralelo ao seu labirinto interior por onde normalmente todos os homens perambulam em busca de si, mas que só encontra nesse labirinto seus demônios, versões arcaicas de si, arquivadas dentro em si, nesse seu eu labiríntico. O eu divino porém, só é possível de ser acessado, despertado, pelo caminho oculto da terceira visão, do terceiro olho. Agora vejam bem, quão difícil é o caminho do autoconhecimento. Mesmo no interior de si, o homem guarda segredos de si, de modo que somente com muito esforço, com muita luta interior, com muito trabalho, o trabalho do autoconhecimento, é que se vai aos poucos revelando o individuo a si mesmo. E após a revelação, ainda vem outras dimensões de defesa que o ambiente interno apresenta. Após tornar-se consciente de si, vêm a dúvida, o medo e a rejeição, três dimensões do mecanismo de defesa acima aludido. É então desafiado o indivíduo a se auto aceitar. Somente após se auto aceitar, ele poderá então apoderar-se de si e mudar e avançar um pouco mais na descoberta de si mesmo. É Por causa desse mecanismo que a grande maioria dos seres humanos, se conformam com o mundo material, realidade onde se pode transferir aos outros, as responsabilidades de suas dores e feitos e assim esquivar-se ainda que ilusoriamente de enfrentar-se a si mesmo. Essa fuga só é possível evadindo-se para o mundo material externo, no mundo interior, no universo subjetivo, a luta é encarniçada, dolorosa e constante e não há como declinar dela. No campo interno, a luta se delonga até que se vença os mecanismos de defesa e se aceite, conforme se verifica. Somente após esse passo, abre-se ao indivíduo, a possibilidade de mudar e mudar é movimentar-se e ao se movimentar-se ele avança.

Em meio a grande luta consigo mesmo, em seu mundo interior naquela noite, ele sentiu grandes dores, seus olhos lagrimejavam em profusão, como que a lamentar a descoberta dele da existência do terceiro olho e da sua insistência em acessar e acionar a terceira visão.

Ele permaneceu por tempo imensurável nessa luta e aqui é forçoso esclarecer que, o tempo interno torna-se diferente nesse campo de batalha, experimenta-se uma duração absurda de tempo interiormente, quando externamente não se passou mais que algumas horas. Nessa ambientação complexa, da sua interioridade, ele persistiu até as lágrimas e então, um pequeno ponto luminoso repentinamente cintilou entre seus olhos. Esse ponto luminoso movia-se harmoniosamente em sentido horário a formar uma espiral, um vórtice parcialmente luminoso com um centro totalmente escuro. Esse vórtice luminoso acendia e apagava-se, ao passo que a concentração se mantinha ou era quebrada pelo barulho interno.

Em sua luta interior ele mantinha se em prece, ora silenciosa ora em recitações de frases de poder tal qual: Eu e o pai somos um, o reino de Deus está dentro em voz, Senhor Jesus Cristo vinde amparar-me e me despertar o eu divino, senhor. Mas as preces silenciosas eram mais eficientes do que as frases repetidas audivelmente e assim, ele insistiu mais. Após algum tempo nesse esforço, o pequeno vórtice luminoso expandiu-se e tomou todo o ambiente. Não era esse vórtice feito de pura luz cristalina, não, era uma luz opaca, marcada de travas, que deixavam o ambiente como que um dia nublado, ou uma noite enluarada. Quando esse vórtice dilatou-se e abrangeu a totalidade do ambiente, a primeira e a segunda visão, ou seja o olho direito e o olho esquerdo se conectaram no ponto central entre as sobrancelhas e um caminho marcado pela luz penumbrosa do vórtice estendeu-se a mostrar o percurso.

O ambiente lumitrevoso era como um oceano de plasma, ou de areia movediça sutilizada, no qual ele naufragava e submergia, descendo por camadas e mais camadas, numa profundidade imensurável, após longo caminho nesse mergulho, então ele alcançou a base do crânio, um lugar tão sutil quanto o terceiro olho, mas na região do que seria a glândula pineal. Nesse ponto, confusão mental o atormentava e procuravam desvirtuá-lo de sua jornada, o silêncio se quedava em preces audíveis e outros sons que o procuravam desviar desse percurso, mas ele perseverou.

Aquela voz assonora de quando em vez orientava-o a perseverar com toda a sua resignação e ele obedecia. Então fazendo silêncio e tentando prosseguir novamente ele se viu tragado às profundezas do seu ser, por entre aquela massa amorfa de plasma ou areia movediça sutil, a formar imagens poderosíssimas que, lhe lhes pareceu um mar de imagens arquetípicas das quais falava Jung. Ele desceu, desceu, desceu, por horas a fio e nunca parecia que ia chegar a algum lugar, então soube ele de algum modo que ele percorrera a cadeia neural da base do cérebro, até a base do seu tronco na região sacral. Naquele ponto ele estagnou e não conseguiu avançar. Ali a luminosidade era mais intensa, mas havia como um tampão a lhe vedar a passagem um grande círculo de trevas, que se assemelhava a uma enorme pedra a vedar a entrada, de onde a luz escapava pelas suas bordas. Ele permaneceu ali, depois exercitou o subir e o descer, indo da base do tronco, à entrada do terceiro olho, como que num esforço para memorizar o caminho.

Na certeza de que caminhava em direção ao seu eu divino, ele adormeceu mais uma vez e na noite seguinte novamente despertou. Dessa vez já sabendo do terceiro olho, ele acionou a terceira visão, seus dois olhos, esquerdo e direito, se conectaram abrindo o caminho e mais uma vez ele mergulhou em si. Chegando à entrada da grande porta sacral, vedada pela grande pedra de trevas ele insistiu, persistiu, lutou por tempo indescritível e por fim venceu, dissipou-se o obstáculo e ele mergulhou naquela luminosidade poderosa a que a voz assonora lhe revelou ser o templo de sua Kundaline, e que dali ele deveria subir e elevar a sua Kundaline até as alturas do transcendente acima do seu chacra coronário. Ele ouviu a voz e pôs-se a obedecer, subiu, subiu, subiu, sempre por entre aquele oceano sutil de substâncias plasmáticas, até que alcançou um desvio a altura da bochecha esquerda e avançando na região do chacra coronário explodiu numa grande projeção de si no infinito divino, além de si. Nesse instante então ele despertou de si mesmo como jamais se tinha visto, sonhado, ou percebido, ele era plenipotente de um modo assustador, então ele ouviu aquela voz a dizer lhe um nome: — Heimbaunt.

 O Seu Nome

O resto da noite ele permaneceu em estado de plenitude, ora dormindo, ora acordado. Andarilhou ele, por suas vidas e por muitas histórias que viveu. Viu faces múltiplas de si, que experienciou até ali, mas não com a consciência, e sim com a intuição e com a terceira visão.

Quando a voz assonora proferiu Heimbaunt ele sentiu uma profunda conexão com o todo e tentou entender com a consciência o que significava tudo aquilo, mas isso não era possível. Somente uma consciência redimida no eu divino, em conexão com o cosmo poderia receber uma força tão imensurável e compreendê-la, pois a consciência irredimida é diminuta por demais, para comportar a grandeza ali visualizada. Em face de tal constatação, somente a terceira visão e a intuição poderiam-lhe servir e dar algum entendimento, produzindo nele algum sentido e foi assim que ele soube que:

a-     Heimbaunt era uma palavra de poder plenipotente que possuía muitos usos e aplicações.

b-     Heimbaunt, não é um termo das línguas dos homens, é um termo da linguagem divina e não encontra em língua nenhuma, nenhum significante que o traduza, nenhum termo semelhante, pois esse termo designava uma singularidade que despertou do cárcere do ego materialista e transcendeu avançando no campo do divino pleno, por meio do cristo cósmico.

c-     Heimbaunt, era sua designação divina, seu nome divino. O nome do seu eu divino. Essa poderosa palavra singular, nomeia e inaugura a sua divindade eu desperta, marca a sua chegada ao reino da divindade por meio do cristo cósmico que lhe veio ao encontro e o guiara ao longo da sua jornada.

d-     Heimbaunt, era seu novo eu, pleno, integrando o ego material redimido ao eu divino, abrindo-o plenamente ao transcendente que ele buscara sem sossego ao longo de tantas existências.

Tudo isso ele experimentou, tudo isso ele vivenciou, tudo isso ele testemunha, para que outros também busquem e façam sua jornada. Não testemunha ele para ser modelo, para ser imitado, não, ele testemunha, para dizer que chegou a um novo ponto de profundidade de sua jornada, porém, nada sabe, apenas despertou.

Esse percurso é fisicamente doloroso, ele está sentindo muitas dores, mas também muita leveza. Ele sabe que não é fácil e que mesmo sabendo o caminho agora, há ainda, muitos obstáculos ao longo da jornada, e o ego falante não descansa na sua algazarra interior, dificultando o percurso.

Heimbaunt é nome singular, é mundo singular é ele nascendo para uma existência que não se esgota jamais, perfazendo a eternidade do divino pleno, como ente cristíco, no cristo logos divino, por toda a eternidade. Não se engane, porém, a pensar que ele mudou, ele está em mutação, mas vestindo a materialidade, na densidade do mundo sujeito aos sentidos, cabe a ele o desafio de redimir o seu mundo material enquanto avança no seu Heimbaunt, que ainda não é pleno e de fato, mas é anúncio e caminho, desse, ele materializado na carne, sujeito a todas as vicissitudes que atinge os demais homens, mas que vislumbrou e experimentou nessa venturosa experiencia a grandeza do que espera todo ser humano que desperta. Se não perceverá, não completará sua transição, sua redenção, para nascer Heimbaunt, tal qual se vislumbrou, ao despertar naquela noite. Eu e o pai somos um.


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